Sunday, December 27, 2009

Toques de Ogã!!

Achamos este vídeo muito simpático no Youtube! É curto e muito significativo!



Saturday, October 17, 2009

Jim Doney (EUA) e Mestre Obashanan (Brasil)

Jim Doney é um grande baterista americano de jazz que se dedicou, ao final dos anos 80 a pesquisa de harmonias e ritmos antigos da humanidade e usa seu conhecimento para fins terapêuticos. Jim é mestre pelo California Institute of Arts. É compositor, professor e produtor musical. Baseando-se nas leis musicais de Pitágoras, criou um instrumento chamado "Harpa pitagórica" A harpa Pitagórica é uma adaptação moderna do monocórdio original de Pitágoras e seu método de afinação gera potencialmente todas as formas de escalas e a harmonias dos povos do mundo, num só instrumento. Nele se encontram escalas Persas, Egípcias, Negro-africanas, Celtas, Indianas, Chinesas, Indígenas, etc, dependendo da região em que se toca o instrumento.

Jim escutou nosso disco "Ayom Lonan" e ficou admirado com o fato de existirem ritmos de transe tão complexos no Brasil que lhe eram desconhecidos. Lhe dissemos que também somos estudiosos da "música das esferas" e depois de uma breve conversa, Jim nos convidou para uma "Jam" no espaço Kuikakali na Vila Madalena, onde fez algumas apresentações em sua visita ao Brasil. Foram quase oito horas de "viagens" intermináveis de improviso em percussão sacra e harmonias antigas e apesar da comunicação precária de ambos - conversávamos em "portunhol" e em "espaglês" - nos entendemos muito bem. Ficou o registro em vídeo e em áudio para no futuro compormos um disco juntos, quem sabe? Jim tornou-se nosso grande amigo e volta o ano que vem. Já marcamos mais um encontro de música e ritmos ancestrais!
Aqui, Jim fala um pouco da Harpa Pitagórica:




Abaixo, em vídeo, alguns momentos da "Jam" de mais de oito horas:

Improviso 1:



Improviso 2:



Improviso 3:

Sunday, September 13, 2009

Pontos da Jurema - 2008


Pontos da Jurema - cd - Capitania das artes - 2008

01.Depoimento; 02.Abertura; 03.Abertura; 04.Abertura-Jurema; 05.Rei Tupinambá; 06.Saudação a Caboclo; 07.Cabaclo Aracati; 08.Caboclo Saraputinga; 09.Rei Salomão; 10.Mestre José Pelintra; 11.Mestre José Pelintra; 12.Cibamba; 13.Mestre Zé da Virada; 14.Zé Bebinho; 15.Saudação a Codó; 16. Mestre Antônio Olímpio; 17.Mestra Joaquina de Aguiar; 18.Malunguinho; 19.Luziara; 20.Luziara; 21.Mestre Manoel Maior; 22.Mestra Maria do Acais; 23.Mestre Benedita; 24.Mestre Germano; 25.Jurema, ponto de defesa; 26.Jurema pau de ciência; 27.Jurema, pau sagrado; 28.Candeinha; 29.Subida dos Mestres e Caboclos;

A prática da Jurema nordestina, também conhecida como Catimbó, é parte de um longo processo de transformação e assmilações culturais que se difundem pela região, sendo encontrada nas comunidades indígenas e no interior de diferentes religiões afro-brasileiras. A Jurema compõe um complexo de concepções e representações em torno da planta Jurema e se fundamenta no culto de possessão aos mestres, cujo objetivo é curar os doentes e resolver os problemas práticos da vida cotidiana, como os infortúnios amorosos e profissionais. Além dos mestres, outra categoria de espíritos é significativa, o Caboclo, ao qual se atribui identificação indígena e conhecimento de ervas e raízes. Esse complexo inclui ainda a bebida preparada com a casca da Jurema e o uso da fumaça dos cachimbos nos rituais.

A organização interna do culto pod eser dirigida por homens ou mulheres. Os objetos litúrgicos, denominados de marcas, resumem-se no Maracá (uma espécie de chocalho), no cachimbo e na Princesa (uma bacia de louça com fumo). O acompanhamento faz-se por meio de instrumentos de percussão (Maracá e palmas), podendo ainda serem acrescidos os tambores Ilus. A cerimônia ritualística principal, do culto é a denominada mesa, realizadas em sessões reservadas de consulta ou durante as festas públicas de consagração dos juremeiros. A cerimônia mais frequente, no entanto é o Toque da Jurema, sessão pública destinada á consulta verbal ás entidades, por ocasião do transe mediúnico, para atender aos pedidos dos interessados. Em forma de roda, gira, os integrantes cantam e dançam, ao som dos Maracás e Ilus; bebem jurema, consomem bebida alcoólica e fumo, num continuum entre ordem e desordem, marcando o caráter lúdico e transgressor do ritual.

Este registro é belíssimo, trabalho ímpar de nosso mano, o mestre Luiz Assunção (veja a capacidade do homem aqui: http://lassuncao.blogspot.com/ ). Um disco muito bem produzido, com um cuidado poucas vezes visto na escolha de repertório, onde imperou principalmente o respeito incondicional à característica do canto e da interpretação ritual.

Olha Luiz, cabra da peste, que venham mais trabalhos como este do vasto mundo da Encantaria (quem sabe sobre o Baião de Cura, a Barquinha, da Baía do Lençol, do Sebastianismo - origem de tudo - ou as inúmeras manifestações do Daime?), pois é gente como você que traz de volta a unidade perdida das legítimas manifestações religiosas brasileiras, cada vez mais à sombra dos edifícios do nazismo neopentecostal.

Para ouvir a faixa 26, "Jurema, pau de ciência", clique abaixo:




Agora, o especial do Fantástico sobre Jurema!!

Wednesday, September 09, 2009

Bezerra da Silva - O rei do Coco - 1975

Bezerra da Silva - O rei do Coco - LP - Tapecar - 1975

01 - O Rei Do Côco; 02 - Língua Grega; 03 - Valente Na Boca Do Boi; 04 - Côco De Itambé; 05 - Rapa Cuia; 06 - Côco Do Tato; 07 - A Coisa Mudou; 08 - Côco Do B; 09 - O Catimbozeiro; 10 - Vai Chover Hoje, Urubu; 11 - Lei De Bahia; 12- Rima de doê;

Bezerra da Silva (Recife, Pernambuco, 23 de fevereiro de 1927 – Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 17 de janeiro de 2005) foi o cantor, compositor, percussionista e violonista brasileiro, considerado o embaixador dos morros e favelas. Cantou sobre os problemas sociais encontrados dentro das comunidades, se apresentando no limite da marginalidade e da indústria musical, pois seus principais temas foram os problemas sociais dentro das comunidades. É considerado um dos principais expoentes do samba do estilo partido alto, embora em seu início de carreira tenha começado a cantar cocos e forrós - foi o primeiro zambubeiro da banda de Zé Ramalho.

Desde sua infância foi ligado à música e sempre “sentiu” que tinha o dom de tocar, causando atritos com a família, principalmente com seu pai, da Marinha Mercante que saiu de casa quando Bezerra era pequeno, vindo morar no Rio de Janeiro. Bezerra, depois de também ingressar - e ser expulso - da Marinha, descobriu o paradeiro do pai e veio atrás dele, com o qual foi morar. Após muitas brigas, foi morar sozinho, no Morro do Cantagalo, trabalhando como pintor na construção civil, trabalhando a noite como percussionista. Logo entrou em um bloco carnavalesco, onde um dos componentes o levou para a Rádio Clube do Brasil, em 1950.

Nos anos sessenta, ficou sem emprego e durante sete anos viveu como mendigo nas ruas de Copacabana, onde tentou suicídio e foi “salvo” por um caboclo da Umbanda de um terreiro onde se tornou seguidor. A partir daí passou a atuar como compositor, instrumentista e cantor, gravando seu primeiro compacto em 1969 e o primeiro LP seis anos depois.

Inicialmente gravou músicas sem sucesso, cocos e forrós. Mas a partir da série Partido Alto Nota 10 começou a encontrar seu público. O repertório de seus discos passou a ser abastecido por autores anônimos (alguns usando codinomes para preservar a clandestinidade) e Bezerra notabilizou-se por um estilo Sambandido (ou Gangsta Samba), precursor mesmo do Gangsta Rap norte-americano. Antes do Hip Hop brasileiro, ele passou a transmitir do outro lado da trincheira da guerra civil não declarada: “Malandragem Dá um Tempo“, “Seqüestraram Minha Sogra“, “Defunto Cagüete“, “Bicho Feroz“, “Overdose de Cocada“, “Malandro Não Vacila“, “Meu Pirão Primeiro“, “Lugar Macabro“, “Piranha“, “Pai Véio 171“, “Candidato Caô Caô". Gravou ainda alguns discos de Exu pela antiga gravadora Tapecar e Cáritas, mas sem serem creditados seus vocais.

Morreu em 2005 após virar evangélico (já não estava mais lúcido!), aos 77 anos de idade, perto de completar 78, eternizando-se no mundo do samba.

Para ouvir a faixa 09 "O Catimbozeiro" clique abaixo:



Tuesday, September 01, 2009

Raul Seixas - Krig-Ha, Bandolo! - 1973


Raul Seixas - Krig-Ha, Bandolo! - LP - Phillips - 1973

01-Introdução_Good Rockin' Tonight; 2-Mosca Na Sopa; 03-Metamorfose Ambulante; 04-Dentadura Postiça; 05-As Minas do Rei Salomão; 06-A Hora Do Trem Passar; 07-Al Capone; 08-How Could I know; 09-Rockxixe; 10-Cachorro Urubu; 11-Ouro de Tolo;

Raul Santos Seixas (Salvador, 28 de junho de 1945 — São Paulo, 21 de agosto de 1989), conhecido por "Maluco Beleza", foi um dos maiores gênios da música brasileira, pioneiro do Rock no país. Filho do casal Raul Varella Seixas e Maria Eugênia Seixas, Raul cresceu na cidade de Salvador um tanto estagnada, alheia aos progressos de uma modernidade que passava ao largo da capital baiana. Tinha um irmão, quatro anos mais novo, Plínio Seixas. Em casa obtém uma cultura que o faz adiantar-se àquilo que era ensinado nas escolas, mergulhando nos livros que tinha à disposição, na biblioteca do pai. Até o final de sua vida, sempre foi avançado para sua época, o que é comprovado pelas músicas por ele compostas e que até hoje são executadas. Como seu parceiro musical Paulo Coelho já disse: "Raul Seixas não é passado, é presente! Futuro!".

O público que se acostumou a ouvir no rádio sucessos como "Lágrimas Nos Olhos", com José Roberto, "Ainda Queima A Esperança", com Diana, ou ainda "Playboy", com os Blue Caps e "Doce Doce Amor", com Jerry Adriani (seu grande amigo), nunca imaginaria que todos este hits eram da autoria daquele baiano magérrimo e torto que aparecia sem camisa, costelas à mostra, na capa daquele LP de título estranho (na verdade, "Krig-Ha-Bandolo" era uma frase dita por Tarzan, nos antigos gibis), cujo sucesso, "Ouro De Tolo", estava nos primeiros lugares de todas as rádios do país. A letra desta canção, além de muito inteligente, mostrava a realidade de um cidadão classe média que "devia estar alegre e satisfeito por morar em Ipanema depois de ter passado fome por dois anos na Cidade maravilhosa".

A sonoridade da música se assemelhava a um sucesso de Roberto Carlos da mesma época, "Rotina". Embora o arranjo fosse parecido, a letra não tinha nada a ver com as imagens poéticas da canção do rei. A letra de "Ouro de tolo", na verdade fazia um contra-ponto com outra letra de Roberto, "A Montanha", do ano anterior, 1972. Roberto cantava "obrigado, Senhor, que o Sol nasceu, obrigado Senhor, eu agradeço...". Raul: "...eu devia agradecer ao Senhor por ter tido sucesso na vida..." Devia, mas não agradecia.
Por estas e outras - principalmente pela faixa que nos interessa mais diretamente -, "Krig Há, Bandolo!" foi um dos mais enigmáticos e misteriosos álbuns quando do seu lançamento, em 1973. Repleto de parcerias com Paulo Coelho, este disco lançava também os primeiros sinais da Sociedade Alternativa, com seu repertório de rocks, baladas, gospel, baião e ponto de Umbanda, no clássico "Mosca na sopa", uma verdadeira salada que marcava a estréia em carreira solo daquele que se tornaria a maior lenda do rock nacional. Raul tinha muita informação esotérica e dos cultos afro-brasileiros, claramente influenciado pelos cultos de sua terra natal. Além desta, cita ainda a lei de pemba na música título do álbum "Eu nasci há dez mil anos atrás", onde diz: "Eu vi os símbolos sagrados de Umbanda, eu fui criança prá poder dançar ciranda".


Influenciado por vários setores da cultura - dos quadrinhos a clássicos da filosofia e do ocultismo (Veja a presença constante da cruz ansata que aparece na capa do disco, na palma da mão direita de Raul, ícone que ganharia ainda mais destaque nos discos seguintes.). A letra de "Mosca na sopa" é Schopenhauer: "Se a mosca, que agora zumbe em torno de mim, morre à noite, e na primavera zumbe outra mosca nascida do seu ovo, isso é em si a mesma coisa", mas para não deixar dúvida sobre sua fonte mais rica, em 1983 pegou do filósofo um trecho do capítulo "Morte" - do livro "Dores do Mundo" - para usar na música Nuit: "Quão longa é a noite do tempo sem limites, comparada ao curto sonho da vida".
Raul morreu aos 44 anos em 1989, de diabetes por complicações no fígado devido ao alcoolismo.

Para ouvir a faixa "Mosca na Sopa", clique abaixo:









Aqui, o raríssimo vídeo original, podraço e funhanhado, mas importante:



Thursday, August 27, 2009

Afrique Vol. 1 - Collection du musée de l'homme -1952



Afrique Vol. 1 - Collection du musée de l'homme - VOGUE - LP - 1952

01.Acclamation des femmes; 02.Acclamations des femmes & Tambour Ogbon; 03.Chants des Mariwo; 04.Choeurs et tambours Ogbon; 04.Discours du Revenant et Choeurs des Mariwo; 05.Iwi Engungun; 06.Souhaits des revenants;


Em 1952, Pierre Verger, o famoso Babalawô, fotógrafo e ethnologista, realizou algumas das mais famosas fotos dos Eguns em terra, pois fotografar os Eguns é proibido. Egun é uma máscara, um ancestral divinizado que volta à terra através de rituais onde são invocadas as forças essenciais do morto para que sua força animal preencha as roupas sagradas de que le se serve para atuar novamente no mundo. Pierre Verger realizou este trabalho em parceria com Gilbert Rouget, o grande Etnomusicologista que trabalhou durante um longo período em Benim.



Este disco é raríssimo. Tão raro que até dói o osso ilíaco!! Existem apenas umas 50 cópias dele no mundo inteiro (se é que ainda existem, pois a gravadora o lançou apenas por causa do trabalho de Verger, mas não acreditava que o produto fosse vender), o que leva os colecionadores a se estapearem quando descobrem algumas delas. Eu mesmo dei umas bofetadas em uns três prá conseguir esse. As gravações foram feitas em um gravador de rolo, em condições absolutamente livres de qualquer acústica, no ambiente natural do templo do Benin.

Há o ritmo maravilhoso do tambor Ogbon, os tambores dos Alabês/Babalawôs da sociedade Oshogboni e o os cânticos de invocação das mulheres e dos homens e o cântico de Mariwô, a palha sagrada de Xapanã e Ogum, os senhores da morte, simbolizando a cortina disposta no chão, na forma de esteira, que separa o mundo dos vivos do mundo dos mortos.

E, finalmente, a última faixa, Souhaits des revenants, onde podemos ouvir a raríssima voz do próprio Egun em terra, organizando a comunidade com seus conselhos e orientações.

Para ouvir a faixa "Souhait des Revenants", a voz do Egun, clique abaixo:






Só para ilustrar, um culto a Baba Egun na África, do "Povo "Zangbeto" os Guardiões da Noite, um Culto Ancestral, patriarcal beninense.



Aqui, um emocionante registro de um Baba Egun, filmado em Lauro de Freitas/Bahia no Ase Opo Aganju, onde o Bàbálàwòrìsà é Obaray (Balbino Daniel de Paula), filho de Alapini Pedro... reparem na alegria do pessoal ao receber seu ancestral, por sinal muito simpático e amoroso!!!


Monday, August 24, 2009

KANGOMA NA AVENIDA PAULISTA


Quarta-feira, 26 de agosto, meio dia!
Avenida Paulista, 1313 - Metrô Trianon - MASP
Em frente à FIESP
Te esperamos lá!!

Saturday, August 22, 2009

Notas sobre o Ayom - Parte II - A importância da música ritual nos cultos brasileiros


O ritmo é uma das forças fundamentais do universo. Todo ritmo descansa em uma sensação física ou psicofísica e nosso sistema nervoso, quando percebe uma serie regular de sons, espera sua repetição ou sua continuação de modo também regular e tem uma acentuada tendência a influenciar os movimentos do próprio corpo. O ritmo é tão importante que se uma pessoa tenta viver fora do ritmo, a natureza o castiga severamente, muito mais do que as criaturas que vivem sem luz, lembrando das criaturas abissais, muitas completamente cegas, que se utilizam de sonares para entenderem o mundo externo. O ritmo é determinado por uma série de unidades, por quantas de expressão e na linguagem oral, a unidade de expressão pode ser desde um grunhido até uma frase complexa, contendo raciocínios perfeitos.

Assim as unidades rítmicas de expressão podem ser sonoras como um suspiro, verbais como uma palavra ou ideológicas como um conceito. O ritmo da linguagem não só se desenvolve segundo as unidades de expressão fonética, mas compreende ainda, as emotivas e mentais, perfazendo várias unidades de ritmo contidas num mesmo discurso. O canto e a risada, a cólera e a alegria buscam um canal rítmico quando um ser humano trata de comunicar seu sentimento a outro ser humano. O sentido acústico da audição tem por fundamento o sentido muscular do esforço e não funciona senão em relação a este último, ou seja a expressão das emoções, quando é traduzida para elementos sonoros visando a comunicação auditiva, combina-se através do inconsciente com a expressão muscular do movimento e se conectam com o sistema nervoso através das formas rítmicas. E muitas emoções internas do ser humano por não possuírem conexões musculares e não se ligarem diretamente com nenhum pensamento determinado, encontram sua exteriorização na música através do ritmo.

Sons são emissões que são interpretadas segundo os pulsos corporais, somáticos e psíquicos. A música está na intersecção em que diferentes freqüências se combinam e se interpretam porque se interpenetram e o pulso na música se apresenta através dos ritmos somáticos (por exemplo o sanguíneo) e ritmos psíquicos (ondas cerebrais). Ambos operam em diferentes faixas de onda, em frequencias sonoras que se apresentam basicamente em duas grandes dimensões: as durações e as alturas (durações rítmicas e melódico-harmônicas). Daí a orquestra de terreiro influenciar as pessoas psíquica e corporalmente e de acordo com a mensagem dos pontos cantados, excitarem e impressionarem o psiquismo como um carimbo através das letras das cantigas e melodias.



A batida de um tambor é um pulso rítmico. Ele emite frequências perceptíveis como recortes de tempo, onde inscreve suas recorrências e variações. Se estas frequencias forem tocadas por um músico ou um instrumento capaz de acelerá-las na medida de dez ciclos por segundo, há um salto para outro patamar, o da altura melódica. A partir de um certo limiar em torno de quinze ciclos por segundo, estabilizando em cem e disparando ao agudo até a faixa possível de se ouvir de quinze mil hertz, o ritmo vira melodia. Nosso ouvido só percebe sinais discretos, separados (portanto rítmicos) até a barreira aproximada de dez hertz (ciclos por segundo). Entre dez e cerca de quinze hertz o som entra numa faixa difusa e indefinida entre a duração e a altura, que se define depois, através da sensação do som melódico (quando a o período das vibrações nos permite escutar a identidade de um possível dó, mi, lá ou si). É aí que se dá o salto qualitativo, pois muda o parâmetro da escuta. Passamos a ouvir todas as variantes que vão do grave ao agudo, o campo das tessituras – assim é chamado o espectro das alturas. E é aqui, nesse campo, que há o enlace corporal e assim, o som grave tende a ser associado ao peso da matéria, com vibrações mais lentas e pesadas, em oposição à leveza e velocidade da sensação do agudo...

E é assim que se processa, dentro de um rito de Umbanda (seja ligado às nações, encantarias, ou mesmo a rituais onde não há o uso de atabaques), as tensões necessárias ao êxtase e instase ritual, pois o clímax é atingido pelo inconsciente que se liga à descrição ritual e se abre às possibilidades de conexão com as consciências de outras esferas. O ritmo está presente no canto (nos terreiros que só cantam) nas palmas, nos instrumentos de percussão e mesmo nas orações e em sua estrutura poética e sua construção invocativa e evocativa.

E é pela relação do som grave com o corpo, que o atabaque RUM, o maior dos três (Os outros são o Rumpi, médio e o Lê, pequeno - nomenclatura Gêge) – induz ao transe mediúnico ou anímico, independentemente do culto que se exerça.

Encerrando, diremos que a música e os pontos cantados são o único elo existente entre todos os templos do Brasil e do mundo (pensemos, por exemplo, nas Américas... os cultos cubanos, por exemplo, de Palo Monte, Arará e Regla de Ocha são muitíssimo similares aos nossos). Nada mais fala tão forte pela unidade ritualística e pela origem comum de todos os terreiros e é a música que abre as portas de conexão com os mundos hiperlativos.

Daí nossa preocupação com os ditos festivais de curimba. É preciso saber que há uma grande diferença entre o que é sagrado e profano, entre ritualizar dentro dos templos com parcimônia, seriedade e consciência de que invocamos potestades sutilíssimas, puras e sumamente poderosas e de que estamos lidando com o inconsciente e com a saúde física, emocional, mental e espiritual de quem acorre a nossos templos ou de levarmos à clubes, estádios e praças a nossa música e toques, simulando contatos mediúnicos em ambientes inadequados e objetivarmos as disputas, vaidades e concorrência em nome do espiritual.

A escolha entre essas duas opções mostra muito bem o estado espiritual de quem o faz. Pois como diz a lenda do Ayom:

Xangô não perdoa quem profana o tambor.

Ayan Irê Ö!!

Obashanan


Friday, August 21, 2009

Zumbi somos nós - 2008


Zumbi somos nós - CD - Frente 3 de fevereiro - Independente - 2008

01.Quem policia a polícia?; 02-Batuque nagô; 03-Linha de frente; 04-Pare e olhe para a base; 05-Estado de sítio; 06-Eu vou subir ao céu; 07-Reza prá caboclo; 8-Canto para Xangô; 9-Canto para Oxum; 10-Periafricania/Brasileiro 2; 11-Já é hora de lutar; 12-Groove Berlim; 13-Por todas as partes; 14-Vamos prá palmares; 15-Zumbi Requilombo; 16-Diáspora;

A Frente 3 de fevereiro é um grupo transdisciplinar de pesquisa e ação direta que discute o racismo na sociedade brasileira. Sua abordagem cria novas leituras e coloca em contexto dados que chegam à população de maneira fragmentada através dos meios de comunicação. As ações diretas criam novas formas de manifestação sobre as questões raciais. Para pensar e agir em uma realidade em constante transformação, permeada por mudançãs culturais de diversas escalas e sentidos, se fazem necessárias novas estratégias. A frente 3 de fevereiro associa o legado artístico de gerações que pensaram maneiras de interagir com o espaço urbano à histórica luta e resistência da cultura afro-brasileira.

Um disco muito bom, onde o rap, a música de terreiro e outras manifestações da música brasileira se encontram com uma inteligência e propriedade poucas vezes vista. Particularmente esse disco nos é importante pois conta com a participação de um grande músico, nosso grande amigo de Kangoma, o Cássio Martins. Para conhecer mais sobre o projeto, visite:

http://www.frente3defevereiro.com.br/

Para ouvir a faixa 08, "Canto para Xangô", clique abaixo:



Wednesday, August 12, 2009

Homapãni Ashaninka - 2000


Homapãni Ashaninka - APIWTXA - CD - 2000
1-Abertura de Moises Ashaninka; 2-Festa do Piarentsi; 3-Depoimento de Napoleão Ashaninka; 4-Ashowiri; 5-Katari; 6-Owashiriwaita; 7-Kyaroa kyaroa Entatsi Oimi; 8-Imapani Showirentsi; 9-Arotamate; 10-Asunkarite; 11-Nowashiritani; 12-Openpe Mainto; 13-Musicas do Kamrape; 14-Empe No seika enperika nokenai;
Atualmente, encontramos os Ashaninka em território brasileiro no Acre, em Alto Juruá, localizados hoje nas margens dos rios Amônia, Breu, Envira e no igarapé Primavera.

As informações da historiografia regional fornecem poucas indicações sobre a presença desse povo em território brasileiro. O padre francês Tastevin realizou várias viagens ao Alto Juruá nas primeiras décadas do século XX e localizou grupos Ashaninka no pé das colinas de Contamana, nas cabeceiras do rio Juruá-Mirim, afluente da margem esquerda do Alto Juruá. Em seu mapeamento dos grupos indígenas do Acre, baseado em fontes de viajantes e cronistas, Castelo Branco (1950: 8) afirma que eles já perambulavam nessa região no final do século XVII e no início do XVIII.

Distantes dos centros urbanos e dos eixos rodoviários, os Ashaninka não sofreram diretamente e de maneira intensiva os efeitos da expansão com a economia agropecuária que caracterizou a “segunda conquista” do Acre na década de 1970. Se os “paulistas” (nome pelo qual eram qualificados os novos colonos vindo do sul do Brasil) também adquiriram vários seringais na região do Alto Juruá para transformá-los em fazendas destinadas à criação de gado, o rio Amônia ficou relativamente afastado dessa frente de expansão, apesar de suas margens também terem sofrido desmatamentos para esse tipo de economia.


Os Ashaninka referem-se a essa época como um período de penúria e de fome, contrapondo-a à situação de fartura que existia no Alto Amônia quando eles viviam mais isolados dos brancos. Durante a década da madeira, o ritual do piyarentsi era freqüentemente invadido pelos posseiros, acusados de embriagar os índios com cachaça e de abusar sexualmente das mulheres. A música e as danças indígenas eram desprezadas pelos brancos, que levavam seus gravadores e impunham suas preferências musicais.

Entre os Ashaninka, tanto a bebida feita de ayuaska como o ritual são chamados kamarãpi (vômito, vomitar). A cerimônia é sempre realizada à noite e pode se prolongar até de madrugada. Um Ashaninka pode consumir o chá sozinho, em família ou convidar um grupo de amigos, mas, geralmente, as reuniões são constituídas de grupos pequenos (cinco ou seis pessoas). O Kamarãpi se caracteriza pelo respeito e silêncio e contrasta fortemente com a animação festiva do ritual Piyarentsi, uma comemoração. A comunicação entre os participantes é mínima e apenas os cantos, inspirados pela bebida, vêm romper o silêncio da noite. Contrariamente ao Piyarentsi, esses cantos sagrados do Kamarãpi não são acompanhados por nenhum instrumento musical. Eles permitem aos Ashaninka comunicarem-se com os espíritos, agradecerem e homenagearem Pawa.
O Kamarãpi é um legado de Pawa (o Deus supremo, conforme veremos abaixo), que deixou a bebida para que os Ashaninka adquirissem o conhecimento e aprendessem como se deve viver na Terra. As respostas a todas as perguntas dos homens estão acessíveis com o aprendizado xamânico, que é realizado através do consumo regular e repetitivo da bebida, durante anos. A formação do xamã (Sheripiari), no entanto, nunca pode ser considerada como concluída. Se a experiência lhe confere respeito e credibilidade, ele também está sempre aprendendo. É através do Kamarãpi que o Sheripiari realiza suas viagens nos outros mundos e adquire a sabedoria para curar os males e as doenças que afetam a comunidade.

O Piyarentsi, por sua vez, possui uma dimensão mais marcadamente festiva, mas também possui dimensões econômicas, políticas e religiosas. O ritual constitui o principal modo de sociabilidade e de interação social entre os grupos familiares. Nos Piyarentsi discute-se de tudo: casamentos, brigas, caçadas, problemas com os brancos, projetos etc.


Na comunidade Apiwtxa, a organização de um ou vários Piyarentsi ocorre com muita freqüência, geralmente todos os finais de semana. O convite para beber tem o caráter de uma obrigação social e rejeitá-lo é considerado uma ofensa. Após contar com a ajuda do homem para arrancar a mandioca, a mulher é a única responsável pela preparação da bebida. Descascada, lavada e cozida, a mandioca (kaniri) é posta numa grande gamela (intxatonaki), onde é desmanchada com uma pá de madeira (intxapatari). Uma pequena porção é posta na boca e mastigada até adquirir consistência de pasta, momento em que é jogada na gamela. Este processo se repete com toda a mandioca. A gamela é então recoberta por folhas de bananeira e a massa deixada em fermentação de um a três dias. O convite é feito, geralmente, pelo marido, que passa de casa em casa avisando aos outros chefes de família que haverá Piyarentsi.Todos os Ashaninka da aldeia participam da festa, em que bebem grandes quantidades de Piyarentsi. Embriagar-se nessa ocasião é sempre um motivo de orgulho. Os homens demonstram sua resistência física, passando dias e noites bebendo, indo de casa em casa, sem dormir. No auge da embriaguez, os Ashaninka tocam suas músicas, dançam, riem. Afirmam que fazem piyarentsi para homenagear Pawa, que se alegra vendo os seus filhos felizes. Foi durante uma reunião de Piyarentsi que Pawa reuniu seus filhos, embebedou-os e realizou as grandes transformações antes de deixar a Terra e subir ao céu (Mendes 1991: 108).

Em razão da presença dos brancos, a freqüência do Piyarentsi e do Kamarãpi diminuiu; alguns Ashaninka também deixaram de usar a Kushma (roupas lindíssimas de pano longo - uma prova de que nossos índios possuíam a tecnologia do tear. Os próprios Tupi-Guarani usavam essas roupas na época do descobrimento) e passaram a vestir-se como os regionais; a língua nativa era discriminada e muitos homens, constantemente solicitados no corte de madeira ou em outras tarefas a serviço dos brancos, deixaram progressivamente de fazer seu artesanato, de tal forma que certas peças, exclusivamente produzidas por eles, como o arco, as flechas e o chapéu, quase desapareceram.

Além dessa redução da atividade cultural do povo, o período de exploração madeireira é também considerado pelos Ashaninka como o momento de mais doenças e mortes. O contato intensivo com os brancos caracterizou-se pela multiplicação das doenças: gripe, pneumonias, coqueluche, sarampo, hepatite, febre tifóide, cólera...

Entre os Ashaninka, encontramos as características que definem os sistemas cosmológicos xamânicos presentes nas terras baixas da Amazônia: universo dividido em vários níveis; a existência de um mundo invisível por trás do mundo visível, o papel do xamã como mediador entre esses mundos etc. Talvez a particularidade Ashaninka resida na sua concepção extremamente dualista do universo, definindo claramente as fronteiras entre o Bem e o Mal.

Segundo o antropólogo Gerald Weiss, o universo indígena, organizado verticalmente, compreende um número indeterminado de níveis superpostos. Assim, de baixo para cima, encontramos, sucessivamente: Šarinkavéni (o “Inferno”), Kivínti (o primeiro nível subterrâneo), Kamavéni (o mundo terrestre), Menkóri (o mundo das nuvens) e outras camadas que cobrem a terra e compõem o céu (1969: 81-90). O conjunto dos níveis celestes é denominado Henóki, mas esse termo também é utilizado como sinônimo de céu, cuja denominação adequada é Inkite.


De acordo com Weiss, mesmo esses níveis sendo inter-relacionados, os moradores de cada um deles experimentam seu mundo de uma maneira sólida. Assim, por exemplo, se tomamos como referência a nossa Terra (Kamavéni), residência dos homens mortais, o céu visível a partir dela constitui apenas o chão do nível imediatamente superior (Menkóri) cuja maior parte permanece fora da nossa percepção visual. Embaixo de Kamavéni, existem dois níveis: Kivínki (-1), residência de “bons espíritos”, e Šarinkavéni (-2) que, segundo o autor, pode ser qualificado como o “Inferno dos Campa”.

Weiss salienta, no entanto, que o nível -1 é mencionado por poucos Ashaninka, muitos considerando que, abaixo da terra, só existe Šarinkavéni: o mundo dos demônios. A cosmologia Ashaninka complica-se quando Weiss identifica os habitantes das diferentes camadas do universo, procurando explicar o papel desempenhado por cada um deles, suas diversas manifestações e suas relações com os Ashaninka. No céu, ou mais especificamente, em cima (Henóki), vivem os bons espíritos. Essa categoria é chamada de Amacénka e também Ašanínka, ou seja, é tomada como extensão da própria autodenominação do povo. Esses espíritos são hierarquizados conforme o poder que lhes é atribuído e sua importância na cosmologia. Os mais poderosos são denominados Tasórenci e são considerados como verdadeiros deuses. Os Tasórenci têm o poder de transformar tudo através do sopro e formam o panteão Ashaninka que criou e governa o universo. No topo dessa hierarquia está Pává (Pawa), o mais poderoso dos Tasórenci, pai de todas as criaturas do universo. Geralmente invisíveis aos olhos humanos, alguns Tasórenci podem, no entanto, aparecer na Terra revestindo-se de forma humana.



Os espíritos do Mal e os demônios, chamados genericamente Kamári, habitam o nível mais inferior, onde vivem sob a autoridade suprema de Koriošpíri. Mas esses espíritos maléficos não residem apenas em Šarinkavéni. Embora essa primeira camada da hierarquia apresente a maior concentração desses seres e abrigue os mais poderosos entre eles, os espíritos nefastos também se encontram, em vários lugares, no mundo habitado pelos homens. Na “nossa” Terra, o principal demônio é Mankóite, que tem sua moradia nas ribanceiras freqüentemente encontradas ao longo dos rios em território Ashaninka. Ele se caracteriza por uma forma humana, mas geralmente permanece invisível. Um encontro com ele anuncia a morte. É interessante notar que, segundo Weiss, o Mankóite vive de maneira semelhante ao branco: os índios pouco falam sobre esse mundo onde moram pessoas estranhas, algumas com um modo de vida semelhante ao do branco (suas casas têm os mesmos objetos, possuem mercadorias casas, carros etc...) e que conseguem respirar na água. Os Ashaninka afirmaram que nenhum deles vive lá e que não gostam de pensar nesse lugar perigoso porque poderiam acordar os espíritos maléficos e chamá-los para o nosso mundo. Todos eles afirmam, no entanto, que essa camada existe e situa-se “embaixo” (isawiki) da nossa Terra.

O Seripiari (xamã) atua como mediador entre os homens e essas diferentes camadas do cosmos. Com o auxílio do tabaco, da coca e do Kamárampi (Ayahuasca), ele procura comunicar-se com os espíritos bons e combater as forças diabólicas, mas também pode dispor seu poder a serviço do Mal (feitiçaria). Dessa forma, o plano em que vivem os homens não é habitado exclusivamente por seres humanos, animais e plantas. Ele apresenta-se como um mundo em equilíbrio frágil, onde os homens vivem constantemente assediados pelo confronto entre o Bem e o Mal.

Embora esse mundo esteja associado à morte e tenha sido qualificado por alguns como o “Inferno”, ele não é sempre apresentado como tal. Segundo o relato de Shomõtse, atualmente o Ashaninka mais idoso da aldeia Apiwtxa, o “Inferno” não se situaria nesse nível subterrâneo, mas estaria localizado no céu ou, mais exatamente, “em cima” (Henoki), e não “embaixo” (Isawiki). Lá existe um “grande buraco com água fervendo numa grande panela”. O dono desse lugar é Totõtsi, cuja principal tarefa é cozinhar os Ashaninka pecadores. A presença do “Inferno” em cima também se encontra em outros relatos, enquanto alguns informantes acreditam que esse lugar esteja situado debaixo da Terra.

Na mitologia ashaninka, o gênero de Sol e Lua são opostos ao português, sendo o primeiro feminino e o segundo masculino. Segundo Weiss, Pawa teria nascido de uma relação sexual de Lua com uma mulher Ashaninka que morreu queimada ao dar à luz a Sol. Desse modo, Lua é considerado o pai de Pawa e este é pai do Inka, o primeiro povo. Antes de subirem ao céu, durante muito tempo Sol e Lua viveram na terra. Lua ofereceu a mandioca (kaniri) aos Ashaninka que, até aquele momento, só se alimentavam de térmitas. Todavia, apesar de ser o pai de Sol e também considerado como Deus, Lua ocupa um status inferior a Sol em razão de suas atividades que o afastam da vida e o aproximam da morte. Ser canibal, Lua alimenta-se dos mortos e o destino dos Ashaninka é serem devorados por ele.

Essa relação de filiação entre a Lua e o Sol parece um pouco problemática entre os Ashaninka do rio Amônia. Kashiri não é sempre reconhecido como pai de Pawa, na medida em que muitos informantes afirmam, categoricamente, que este sempre existiu e criou tudo, inclusive Lua. Este é visto como um ser ambíguo, ao mesmo tempo considerado como um Deus fornecedor da mandioca (kaniri), mas também associado a um ser canibal que briga periodicamente com Sol (eclipses) e é associado ao mundo dos mortos.



Segundo os Ashaninka do rio Amônia, após a vida na Terra, os mortos (kamikari) vão, num primeiro momento, para o mundo “embaixo” (isawiki), onde permanecem por um tempo. Nas fases de lua nova, Kashiri ingere-os e leva-os para Pitsitsiroyki, onde os entrega a uma estrela. Esta é encarregada de lavá-los, perfumá-los e guardá-los até a visita de Pawa que, periodicamente, vem escolher entre os mortos os Ashaninka que ele reconhece como filhos legítimos e deseja guardar perto de si.

A visão do branco (wirakotxa) aparece com destaque na mitologia nativa. O primeiro wirakotxa de que os Ashaninka do rio Amônia afirmam ter conhecimento é o espanhol que surge de um lago, em decorrência de um ato de desobediência do Inka ao seu pai Pawa, e vem perturbar a ordem do universo.
“Antigamente, o wirakotxa morava dentro de um lago. Aí, Inka foi pescar com outro Ashaninka. Era de madrugada. Aí, escutou galinha no fundo e disse: “Rapaz, vamos pegar isso”. “Não precisa não, fica assim mesmo, não vamos mexer não”. No outro dia, a mesma coisa. De novo, ouviu galinha, ouviu cachorro latir no fundo (...). Aí, Inka foi ver Pawa. “Não mexe não, meu filho”. Mas Inka não escutou e foi mariscar [pescar]. Escutava galinha assim bem pertinho, escutava cachorro. “Vou pegar galinha”. Aí, botou anzol com banana, pedaço assim (...) Aí, saiu galinha. Aí, botou de novo, saiu cachorro. Aí, escutou de novo barulho. Pegou banana e saiu Branco. Aí, wirakotxa subiu na Terra. Aí, Pawa ficou brabo e perguntou: “Por que tu foi buscar wirakotxa?”. “Papai, eu fui pegar galinha e wirakotxa saiu”. “Eu não quero esse branco pra cá junto com nós. Eu deixei ele pra lá mas tu gostou dele, agora pode ficar pra tu! Agora, eu vou embora e tu vai ficar com wirakotxa e trabalhar pra ele” (Seu Alípio, Ashaninka morador do rio Amônia).

O fato de Inka ter pescado a galinha e o cachorro antes do branco é considerado sinal de advertência de Pawa ao seu filho, para que ele interrompesse sua atividade infelizes. Esses animais, trazidos pelo branco, eram desconhecidos dos Ashaninka, que têm um acervo muito variado de mitos para explicar o surgimento da maioria dos animais. Estes eram, inicialmente, Ashaninka que perderam sua aparência humana e foram transformados em animais por Pawa ou pelos Tasorentsi. Todavia, a galinha (txaapa) e o cachorro (otsitsi) nunca foram Ashaninka. Eles surgiram do lago onde eram os fiéis companheiros do branco. Em alguns casos, a comparação com o cachorro foi usada por informantes para qualificar genericamente o branco e/ou seu comportamento: “feio como um cão”, “sovina como cachorro”, “fedorento como cachorro”...

O surgimento do wirakotxa na Terra é portanto o resultado da desobediência do Inka a Pawa, que havia inicialmente separado os Ashaninka dos brancos. Na mitologia indígena, a irresponsabilidade do Inka é mais um exemplo de uma longa lista de erros cometidos pelos filhos de Pawa nos tempos originais. O conjunto desses erros explica a situação atual dos Ashaninka e as imperfeições do seu mundo.

A importância desse evento é reforçada por muitos que consideram que foi em decorrência direta desse ato que o Deus Criador subiu ao céu. Cansado das sucessivas desobediências de seus filhos, Pawa teria decidido deixá-los sozinhos na Terra e morar no céu, onde permanece até hoje, usufruíndo de um mundo perfeito. Outros dizem que Pawa ainda ficou durante um tempo na terra, onde tentou construir um muro para separar os Ashaninka dos brancos. De uma maneira geral, a visão que os Ashaninka do rio Amônia constroem do branco pode assemelhar-se à categoria genérica dos espíritos malévolos, kamari. Como eles, o branco é associado à morte e às doenças (matsiarentsi). Os índios acreditam que as doenças são o resultado desses seres nefastos ou da atividade de um xamã maldoso através da feitiçaria. Frente às perigosas e desconhecidas doenças dos brancos (mãtsiari wirakotxa), a sabedoria do sheripiari é ineficaz.

Interessante notar as pontes que o povo Ashaninka exerce entre as nações indígenas do território brasileiro com as nações do Peru e outros povos, como os Incas (Ashan-INKA) e os Maias, nos levando à conclusão de que os povos amazônicos e os grandes impérios do passado Sul Americano possuíam importante contato e relacionamento. Há relatos de que os Ashaninka tenham resistido à voracidade do império Inca. Daí percebe-se que o deus do inimigo se transforma no novo inimigo branco. Viracocha ou Wiracocha ou Huiracocha (no idioma quechua: Apu Kun Tiqsi Wiraqutra) é a divindade invisível, criadora de toda a cosmovisão andina, era considerado como o esplendor original, o Senhor, Mestre do Mundo, sendo o primeiro deus dos antigos tiahuanacos, que provinham do lago Titicaca, de cujas águas teria surgido, criando então o céu e a terra. É o arquétipo da ordem do universo no homem. Este deus, ou Huaca, aparentemente também está presente na iconografia dos habitantes de Caral e de Chavín, antigas cidades no atual território do Peru.


Em quechua, tiqsi significa "fundamento, base, início"; enquanto que wiraqutra provém da fusão dos vocábulos: wira (gordo) e qutra (que contém água - lago, lagoa). Na simbologia dos antigos andinos, a gordura era um símbolo da energia, e a água o elemento capital do ciclo vital do universo. O Viracotxa dos Ashaninkas é o mal que surge do lago, como vimos.

Finalizando, este é um disco muito importante, tanto pelos fatores da própria história dos Ashaninka que é um povo maravilhoso, e mais ainda pela presença ímpar de seus melodiosos tambores - muitos ainda se esquecem de que nossos índios tocavam e tocam tambor. Sua música evidencia traços muito fortes das origens dos Maracatus e dos Caboclinhos, além dos diversos ritmos de origem norte/nordeste do Brasil, com seu acompanhamento de flautas e canto rimado.

Para ouvir a faixa 04, Ashowiri, clique abaixo:

















Sunday, August 09, 2009

CEGO OLIVEIRA - 1988



CEGO OLIVEIRA - Rabeca e Cantoria - 1988 - Reedição - CD - 1999 - Cariri Discos
Disco 1 - Lado A - Asa branca; 2-Leva eu Corina; 3-Maria José; 4-Sereno de amor; 5-Morena bota a barca n’água; 6-São José também chorou; Lado B - 1 - Choro da cabritinha; 2-Ai, Lampião, cadê tua muié?; 3-Minha rabequinha; 4-Bendito de N. S, das Dores; 5-A revolta de São Paulo; 6-Despedida de reisado;
Disco 2 - Lado A - 1-Acorda Maria acorda; 2-Lampião; 3-Bendito de N. S. das Candeias; 4-Bendito de N. S. do Socorro; 5-Essas mocinhas de hoje; Lado B - 1-Severina; 2-Águas caririzeiras; 3-Arraiá; 4-Anunciada; 5-Zebelê; 6-Adeus pessoal; No cd é acrescida "Na porta dos Cabarés"

Compositor. Instrumentista. Tocador de rabeca. Cantador. Uma lenda da música brasileira!

Cego Oliveira não era exatamente cego, mas portador da visão subnormal. Ao registrar o mundo ocorriam-lhe alterações oculares que produziam interferências na sua maneira de olhar. Uma outra visão de mundo. Em geral, via mais longe com sua criatividade do que os que olham apenas por suspeita.

Natural do Juazeiro do Norte, no Ceará, em 1929 teve o primeiro contato com a rabeca, ao receber de um tio um desses instrumentos (lembrando que nossa Rabeca pouco tem a ver com o Violino europeu. É, antes, um instrumento de origem árabe/judaica - o Nefer, ou Rebab árabe -, cruzado com as Maracás de nossos índios - Maracás eram o nome dado não só aos chocalhos, mas aos violões e violinos Tupis-Guaranis).
Foi um representante de um estilo musical pouco conhecido e em vias de extinção: o romance. Os romances remontam à Europa medieval, e contam histórias - por vezes bastante longas- em forma de versos com estrofes e rimas intrincadas. Oliveira declarou já ter possuído um repertório de nada menos que 75 "rumances", dentre os quais o famoso "Romance do Pavão Misterioso" e "A verdadeira história de João de Calais".
Tal qual um menestrel Ibérico, percorria praças e feiras desfiando sua cantoria e ponteando sua rabeca a troco de moedas e dinheiro miúdo dos ouvintes, em sua maioria, gente humilde do sertão do Ceará, cuja única diversão era ouvir velhos cantadores.
A popularização do rádio foi aos poucos acabando com o espaço de Oliveira e outros vates da época, que passaram a sobreviver tocando em velórios, batizados ou aniversários. Em 1975, Cego Oliveira foi filmado pela diretora Tânia Quaresma no documentário "Nordeste: Cordel, Repente e Canção" (que vocês podem assistir abaixo). É interessante notar a posição com que toca sua rabeca, apoiada sobre os ombros, e o fraseado simples, utilizando os harmônicos naturais das cordas. Observe também a influência da cantoria de viola, onde o cantador para de tocar o instrumento enquanto canta, fazendo-se acompanhar de marcação rítmica batucada no próprio corpo do instrumento.

Aprendeu a tocar por conta própria e a decorar os versos das cantorias com a ajuda de um irmão quer lia para ele os versos dos romances. Aprendeu a viver duramente como muitos de nossos heróis que insistimos em não ver - cegos as avessas que somos com nossa cultura (só vemos o que desejamos) -, pois estes se apresentam com a roupa rota, com os pés e as mãos calejados e o olhar triste de séculos de opressão e agonia. São uma amostra clara do Brasil que insistimos em negar e esquecer. Enfim, nos envergonhamos do que nos faz ilustres. O seu jeito de cantar e tocar traz a valência de todo o mistério religioso do nordeste, em especial as litanias católicas em paralelo com os lamentos indígenas. Há muito do aboio, de origem árabe, ecos de um oriente furioso, revelando ao mundo moderno o poder da ancestralidade modal e sua voz é o exemplo fustigante das rezas dos verdadeiros encantados, além dos temas onde morte, sofrimento, alegria e amor se combinam nas doses exatas para o deslumbramento.

Há algo que une cantadores do Brasil como Cego Oliveira aos primitivos Bluesmen americanos como Robert Johnson e Blind Lemon Jefferson (este também cego) além do sentimento de "Banzo" (palavra Quibundo significando tristeza que foi relacionada pelos afro-americanos à palavra inglesa "Blues"), mas apesar disso, há um interesse muito maior dos brasileiros pelo Blues americano do que pelos cantadores de nossa terra, quase sempre desprezados e esquecidos. A verdade é que o público brasileiro não sabe lidar com os valores que possui. Se fosse americano, Cego Oliveira seria conhecido e repeitado no mundo inteiro.

O tocador de rabeca morreu em 1977 com 94 anos, pobre e desconhecido.
Para ouvir a impressionante "Na porta dos Cabarés" Clique abaixo:




O igualmente impressionante e único vídeo de Cego Oliveira, finalzinho de "Na porta dos Cabarés":







Saturday, August 08, 2009

Tribo Massahi estrelando Embaixador - 1972


Tribo Massahi estrelando Embaixador - LP - Reverse - 1972

Lado A: 01. Timolô, Timodê (1 - Walk By Jungle, 2 - Fareua, 3 - Harmatan, 4 - Dandara)
Lado B: 02. Lido´s Square (1 - Pae João, 2 - Menina Da Janela, 3 - OAN, 4 - Madrugada Sem Luar)

Disco raríssimo com apenas duas longas faixas em estilo jam, com quatro temas cada uma. Um misto de soul, ritmos latinos e africanos, com um clima lisérgico tão comum à época.

Parece que a banda tenta repetir a sonoridade de Fela Kuti (importantíssimo músico africano criador do afro-beat) com pitacos de Soul estilo Stax (na verdade lembra muito o disco malucaço do esquecido cantor de soul Miguel de Deus, o igualmente raro "Black Soul Brothers") e macumba brasileira. Um disco mal gravado, improvisadíssimo (com a galera aparentemente muito louca!), a banda parece que nem ensaiou, mandando tudo de primeira, mas é um time de músicos que comparece, principalmente os alabês!

Na verdade tudo que se refere a este disco é um mistério!

Quem tiver maiores informações, por favor, me mande.

Para ouvir excerto da faixa 02 - Lido's Square - Pai João, clique abaixo:

Thursday, August 06, 2009

ACERVO AYOM NA REVISTA + SOMA!!

O acervo Ayom foi entrevistado pelo pessoal da + SOMA http://www.maissoma.com/ , através do repórter André Maleronka. A + SOMA, atualmente é a maior revista de cultura e arte contemporânea do Brasil. Abaixo, as fotos e a entrevista na revista.
Para ler a entrevista clique abaixo e faça o download em arquivo PDF:

http://www.mediafire.com/download.php?mmtmhm3onid



"(...) incomparável é o resgate realizado pelo etnomusicólogo Yan Kaô (Obashanan), pesquisador incansável da música de terreiro brasileira e das suas relações com a música popular".

Editores da + Soma











Saturday, August 01, 2009

A Índia Negra e os paralelos de união entre os cultos brasileiros

Indianos do grupo Siddi

Umbanda e Candomblé em algum ponto de sua história religiosa se unem, ou pelo menos se encontram ou derivam um do outro, quer seja a Umbanda descendente dos Candomblés Bakongo/Ngola, quer seja o próprio Candomblé Yorubá Urbano, que ressurgiu nas grandes metrópoles a partir do contigente Umbandista em cidades como São Paulo e Curitiba.
Seria tão somente coincidência que palavras como Orixá, Exu, Ogum, Oxossi, rum, lê, Roncó, peji, Zamby, Egun e tantas outras existam tanto em uma tradição quanto em outra? Assim como palavras indígenas - e este é mais um caso a ser discutido - entraram para o mundo social dos terreiros indistintamente, assim também fundamentos africanos foram se espalhando por todos os cultos brasileiros de forma mais ou menos uniforme.
Sabemos que por dentro da Umbanda os nomes se ligam aos fonemas originais da fala cósmica, embora, claro, tudo possa ser discutido à luz das provas factuais tão queridas pela academia. Isso por um lado, pelo lado umbandista, de alguns setores esotéricos. Por outro, pelo lado das Nações Africanas, por mais que se abalize o fim do sincretismo nas novíssimas gerações dos candomblés brasileiros, há que se tomar o cuidado de se repensar cautelosamente 500 anos de história e os porquês dela assim ter acontecido. Mas tal assunto é oportuno para uma outra discussão, em outro texto, pois acreditamos que o ideal para a perfeita relação entre os cultos seja, inicialmente, o encontro das semelhanças rituais, cânticos, danças etc, de tudo aquilo que é compartilhado naturalmente, já que, de uma forma ou de outra, todos pertencem, nas origens, a uma mesma linhagem e família espiritual.

E mesmo que se pense em termos históricos e/ou tempos míticos, onde algumas correntes entendem que a Umbanda é mais nova que os Cultos de Nação e outras acreditam que ela é origem de todas as religiões do mundo, ainda assim, em ambos os conceitos há convergência, há conexão entre saberes muito antigos usados por todos. Partem de uma mesma fonte, ou são rios que se encontram num mesmo mar que só os apegados ao não-diálogo, à diversidade voltada ao ódio e à disputa não conseguem ver. Chegará um dia em que, finalmente, poderemos discutir com felicidade sobre fundamentos católicos, esotéricos, kardecistas, africanos, indígenas e tantos outros que fazem a Umbanda ser tão rica e tão maravilhosamente necessária ao colorido das opiniões diversas mas nunca contrárias em si e nem contraditórias em sua fenomênica e doutrina? Quem sabe?

Mas vamos ao que interessa: até prova em contrário que seja admitida pela ciência (pois ela mesma assim afirma, embora hajam ainda provas incontestes que podem revolucionar este conceito - o da origem humana em solo sul-americano), por volta de 50 mil anos atrás, povos negros deixaram o continente africano, adentrando a Europa, Ásia, e o continente americano modificando seu fenótipo em função dos diferentes ambientes que encontravam. Assim, a pele tornou-se branca pela ausência de sol, os olhos tornaram-se oblíquos pela adaptação a locais de muito vento, etc. No século V a.C, Heródoto afirmava existirem duas “na­ções etío­pes”, uma na Áfri­ca, ou­tra em Sind, re­gião cor­res­pon­den­te aos ­atuais ter­ri­tó­rios da Í­ndia e do Paquistão.
Marco Pólo escreveu que os in­dia­nos re­pre­sen­ta­vam ­suas di­vin­da­des co­mo ne­gras e os de­mô­nios como brancos, afir­man­do que ­seus deuses e san­tos ­eram pre­tos. Mais, ainda, em O Livro das Maravilhas, atribuído ao viajante (Porto Alegre, L&PM, 2006, pág.236), lê-se que os habitantes do “reino de Coilum”, atual cidade de Quilon, na província de Querala, eram “todos de raça negra”.
Esses povos in­dia­nos te­riam sido le­va­dos co­mo es­cra­vos da África, inicialmente por mer­ca­do­res ára­bes e de­pois pelos por­tu­gue­ses em suas naus, per­fa­zen­do uma ro­ta li­to­râ­nea situada hoje nos ­atuais Iêmen, Omã, Irã e Paquistão. Cativos e importantes em muitas tarefas, se destacaram como sol­da­dos nos exér­ci­tos dos che­fes mu­çul­ma­nos, a par­tir do sé­cu­lo ­XIII. Por vol­ta de 1459, o rei mu­çul­ma­no de Bengala possuía um exér­ci­to de 8 mil es­cra­vos africanos. Em 1500, foram conquistados pelos portugueses os ter­ri­tó­rios in­dia­nos de Goa, Damão e Diu, o que trans­for­mou dras­ti­ca­men­te a es­cra­vi­dão na Í­ndia: o de­sem­pe­nho de ­seus es­cra­vos foi relativizado a ta­re­fas me­no­res em ­seus ne­gó­cios, ca­sas e fa­zen­das e as mu­lhe­res negras pas­sa­ram a ser ­mais uti­li­za­das co­mo con­cu­bi­nas ou pros­ti­tu­tas.
Sob o domínio inglês, a maio­ria foi re­pa­tria­da pa­ra a Áfri­ca e ­seus des­cen­den­tes fo­ram dei­xa­dos em bol­sões ao lon­go da cos­ta oci­den­tal, principalmente nas re­giões cen­tral e sul (esta tese nos faz pensar: a palavra Umbanda pode tanto ser de origem Bantu como pode ter vindo, realmente, dos povos indianos que retornaram à África). Hoje o país com maior população negróide é a Índia. Hoje, além dos po­vos ­afro-in­dia­nos que lá che­ga­ram ­mais re­cen­te­men­te, os drá­vi­das cons­ti­tuem uma das pro­vas incontestes des­sa pre­sen­ça, pois estão no continente há milhares de anos, antes mesmo da invasão ariana. Localizados no Sul do ­país, e con­tan­do por volta de 100 mi­lhões de in­di­ví­duos, os povos Dravidianos têm pe­le bem es­cu­ra e fei­ções africanas, ­além de cos­tu­mes, lín­gua e he­ran­ça cul­tu­ral que evi­den­ciam la­ços com as ci­vi­li­za­ções egíp­cia, cu­xi­ta e etío­pe (segundo nos diz Nei Lopes em Kitábu: o Livro do Saber e do Espírito Negro-Africanos - Editora: Senac Rio, 2005) .
Construtores de alguns dos mais antigos e misteriosos com­ple­xos ur­ba­nos da história humana, tais co­mo os de Harappa e Mohenjo-Daro, ­mais tar­de fo­ram re­du­zi­dos também à con­di­ção de es­cra­vos e co­lo­ca­dos no ­mais bai­xo pa­ta­mar do sis­te­ma de cas­tas ins­ti­tuí­do pe­los aria­nos. Até 1951, o rei (Nizam) de Haiderabad man­te­ve uma guar­da de­no­mi­na­da “ca­va­la­ria afri­ca­na”. E es­sa re­gião (a zo­na de Siddi Risala de onde provém as fotos que abrem nosso artigo. Veja em http://www.kamat.com/kalranga/people/) con­ser­va, na cultura musical, na dança e no uso de pa­la­vras da lín­gua suaí­le, for­tes tra­ços cul­tu­rais afri­ca­nos. Pes­qui­sas re­cen­tes des­co­bri­ram a exis­tên­cia de co­mu­ni­da­des ­afro-in­dia­nas em Karna­kata, Gujarat e Anhara Pradesh, onde ­seus mem­bros se au­to­de­no­mi­nam “afri­­ca­nos” (con­for­me The African Dias­po­ra in India, 1989).

Mas muitos podem perguntar: o que este texto tem a ver com a introdução? Aqui talvez esteja o paralelo existente entre as “Umbandas Africanistas” e as Nações Africanas dos Candomblés brasileiros, com seus mistérios milenares de 10.000 anos atrás e a “Umbanda Esotérica” de muitos fundamentos indianos, remontando a datas bem anteriores, de períodos míticos e pré-históricos. As origens são as mesmas e as conexões evidentes. Por isso o atabaque, Ifá e Orixá, chacra e reencarnação pertencem tanto a uma corrente quanto à outra em suas questões metafísicas mais profundas. Basta saber olhar.

P.S. – Já ia esquecendo: é claro que não veremos nenhum negro indiano na novela da globo, assim como muitos não querem que a África exista dentro da Umbanda e que a Umbanda tenha raízes com a Índia.

Ayan Irê Ô!
William de Ayrá (Obashanan)

Friday, July 31, 2009

Yukihiro Takahashi - SARAVAH - 1974


Yukihiro Takahashi - SARAVAH - Compacto duplo - King Records - 1974

Lado A - Moody Indigo;
Lado B - Saravah!

Sim, senhores, podem acreditar em seus olhos!! Não, vocês não estão loucos, e o responsável por este blogue e por este acervo também não!! Você está no lugar certo, e na hora certa (que horas são?), aqui é realmente o ACERVO AYOM e é o único lugar onde você encontra raridades impressionantes como esta! Sim, a sua estupefação foi igual a minha quando, em minhas constantes e árduas buscas pela "Música do Santo", me deparei com este disquinho num sebo do Bairro da Liberdade (tradicional bairro da colônia japonesa de São Paulo). Li várias vezes, com incredulidade, o título, e como não conseguia ler o que dizia a parte de traz da capa do compacto (evidentemente em japonês!), pedi ao lojista que me ajudasse.
Apesar dos olhos puxados e da camisa escrito "Tóquio", o balconista me respondeu que se chamava Roberto Argemiro, que era brasileiro e não sabia ler japonês (talvez fosse um índio), mas chamou a dona da loja (uma bravíssima senhora que deveria ter uns 350 anos) que me deu uma tradução rápida, num japonês pré-histórico com sotaque Ainu e aqui conto o que consegui entender: o disco foi concebido numa viagem de duas semanas de Yukihiro à Paris, onde conheceu uma brasileira que era... DA UMBANDA (a senhorinha não sabia o que era isso, apenas disse que a palavra e que era uma "religión, né?")!!! Takahashi ficou muito impressionado com a palavra Saravá e seu significado (não sabemos o que a moça disse prá ele, mas deve ter sido coisa boa...), etc, etc, etc...



Como Yukihiro é um amante do samba bossa-nova de Tom Jobim, provavelmente a palavra o fêz lembrar-se de Carlos Lira com seu disco homônimo. Nascido em 52, Yukihiro Takahashi é um dos mais respeitados arranjadores do Japão e foi membro da banda de Rock Pop/Progressivo Yellow Magic Orchestra, juntamente com os igualmente famosos Haruomi Hosono e Riuichi Sakamoto (prá quem não se lembra, foi o compositor da belíssima trilha sonora do filme "O Grande Imperador"). A banda conseguiu chegar ao topo da parada britânica com o sucesso “Firecracker” no final dos anos 70 e foram uma grande influência no surgimento do acid house e do movimento techno do final dos anos 80 e começo dos 90.


A música Saravah é um samba bossa-nova cantado em Japonês, com as óbvias interpretações regionais que o suingue local permite. Com um arranjo belíssimo, a música é excelente, por mais estranho e bizarro que possamos achar um japonês legítimo fazendo um belo Saravá! Mas é a "Banda" já em 1974 chegando do outro lado do mundo! E salve Ela!


Para ouvir a faixa "Saravah", clique abaixo:

Thursday, July 30, 2009

Kangoma na Feira Preta - Pílula de Cultura


Show do Kangoma na Feira Preta - evento Pílula de Cultura

Horário: 2 agosto 2009 às 19:00h


Rua: Av. Francisco Matarazzo, 2000 - Barra Funda
Cidade: São Paulo
Phone: 11 3031-2374 - entrada franca